quinta-feira, setembro 30, 2010

Era manhã de setembro

Era manhã de setembro
e
ela me beijava o membro.
Aviões e nuvens passavam
coros negros rebramiam
ela me beijava o membro.
O meu tempo de menino
o meu tempo ainda futuro
cruzados floriam junto
Ela me beijava o membro
Um passarinho cantava,
bem dentro da árvore, dentro
da terra, de mim, da morte
Morte e primavera em ramo
disputavam-se a água clara
água que dobrava a sede
Ela me beijando o membro
Tudo o que eu tivera sido
quando me fora defeso
já não formava sentido
Somente a rosa crispada
o talo ardente, uma flama
aquele êxtase na grama
Ela a me beijar o membro
Dos beijos era o mais casto
na pureza despojada
que é própria das coisas dadas
Nem era preito de escrava
enrodilhada na sombra
mas presente de rainha
tornando-se coisa minha
circulando-me no sangue
e doce e lento e erradio
como beijava uma santa
no mais divino transporte
e num solene arrepio
beijava beijava o membro
Pensando nos outros homens
eu tinha pena de todos
aprisionados no mundo
Meu império se estendia
por toda a praia deserta
e a cada sentido alerta
Ela me beijava o membro
O capítulo do ser
o mistério do existir
o desencontro de amar
eram tudo ondas caladas
morrendo num cais longínquo
e uma cidade se erguia
radiante de pedrarias
e de ódios apaziguados
e o espasmo vinha na brisa
para consigo furtar-me
se antes não me desfolhava
como um cabelo se alisa
e me tornava disperso
todo em círculos concêntricos
na fumaça do universo
Beijava o membro
beijava
e se morria beijando
a renascer em dezembro

Carlos Drummond de Andrade

Passei toda a noite

Passei toda a noite, sem dormir, vendo, sem espaço, a figura dela,
E vendo-a sempre de maneiras diferentes do que a encontro a ela.
Faço pensamentos com a recordação do que ela é quando me fala,
E em cada pensamento ela varia de acordo com a sua semelhança.

Amar é pensar.
E eu quase que me esqueço de sentir só de pensar nela.
Não sei bem o que quero, mesmo dela, e eu não penso senão nela.
Tenho uma grande distração animada.

Quando desejo encontrá-la
Quase que prefiro não a encontrar,
Para não ter que a deixar depois.

Não sei bem o que quero, nem quero saber o que quero.
Quero só Pensar nela.
Não peço nada a ninguém, nem a ela, senão pensar.

Fernando Pessoa

quarta-feira, setembro 29, 2010

Francis Bacon - 1

Viiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiillllma!

Muita gente faz cinquenta anos...

Sem título

Subo neste palco
O escuro me sufoca
Filhos de Malcon McLaren
É o som que toca
Num velho cassete

Quando não mais falarem
Esqueço o texto
E tudo se repete
Meu desempenho bissexto
É o preço que se paga
E o cheiro de álcool
Traduz a sina
De setenta até sete

Num velho cassete
Não mais som toca

domingo, setembro 26, 2010

A Arte de Amar

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus — ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.

Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.

Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

Manuel Bandeira

sexta-feira, setembro 24, 2010

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Manuel Bandeira

quinta-feira, setembro 23, 2010

São

Neste dezesseis de Setembro um conhecido nosso resolveu desistir. Eu não era um amigo, mas apenas um conhecido. Chegamos a tomar algumas cervejas juntos, mas o mais importante é que compartilhamos amigos. Alguns meus eram alguns dele. Ou muitos. Ele teve perdas das mais difíceis e profundas. Quem olha de fora, talvez as entenda como simples e rasas. Mas só quem está ali é que sabe como tudo acontece.

Ele deixou um texto que foi compartilhado por um dos amigos compartilhados. Nem sei se eu deveria colocar aqui esse texto. Não sei se ele gostaria ou não. Ele não me diria antes, muito menos agora. Quando o li, não pude deixar de pensar em nós, os amigos que compartilharam de sua existência. Mesmo eu, que tão pouco com ele convivi. E então, resolvi compartilhar também.

Quando li, não pude deixar de pensar em mim. Quando li, não pude deixar de pensar em perdas que sofri. Quando li, não pude deixar de pensar em pessoas que perdi. Quando li, não pude deixar de pensar em sonhos que ficaram nos caminhos. Quando li, não pude deixar de pensar nos amigos compartilhados. Mas, quando li, não pude deixar de voltar a ter os olhos em direção a sonhos que nós todos, que já tanto caminhamos, ainda podemos ter.

Paz para a alma do Sãozinho.



"Não haverá amanhã.

Quando todas as portas se fecham, abre-se o injustificável.
Uma covardia para qual se necessita uma coragem imensurável.
É o fim... meu fim.
Eu tentei...
Tentei muito...
E foi tentando que muitas vezes acertei,
e que provavelmente que eu também errei.
Vivi, sobrevivi, insisti...
Fiz de tudo um pouco, e do pouco muito.
Ainda assim este muito foi pouco.
Cansei...
Perdi a esperança... e sem ela não existe vida.
Desisti de mim, o que mais posso fazer.

Na equação da vida onde tudo é a somatória do “ser e do estar” eu me esqueci da plenitude do que é o viver.
Convivi com pessoas fantásticas.
Dentre todas, minha companheira de jornada, meu tesouro, meu baluarte, meu amor.
Tive amigos que me surpreenderam nas horas incertas e amargas, amigos de ombros largos.
Como também tive amigos que não me surpreendeu, talvez por não tiver dados a eles uma chance.
No emaranhado da vida eu me perdi,
Perdendo todos os sonhos...
E sem sonhos não se vive.

Acabei desistindo de mim.
Desistindo de tudo.
Meus motivos aos olhos de outrem podem ser fúteis,
Porem pra mim, era o meu tudo. E eu perdi este tudo.
Em algum lugar de minha existência, perdi a essência do que é viver.
Por isto não haverá amanhã pra mim.
Sem rancores, sem magoas
Apenas cansei de continuar vivendo este milagre que é a vida.
Porem para mim estava sendo muito difícil levá-la ou deixar ela me levar.
Viver nos últimos tempos era um tormento, uma tortura ver as horas passarem e eu passar com elas.
Quero estar leve
Morrer, de um jeito ou de outro, todos nós vamos um dia.
Apenas furei a fila.
Antecipei o tempo."


domingo, setembro 19, 2010

Ao coração que sofre

Ao coração que sofre, separado
Do teu, no exílio em que a chorar me vejo,
Não basta o afeto simples e sagrado
Com que das desventuras me protejo.

Não me basta saber que sou amado,
Nem só desejo o teu amor: desejo
Ter nos braços teu corpo delicado,
Ter na boca a doçura de teu beijo.

E as justas ambições que me consomem
Não me envergonham: pois maior baixeza
Não há que a terra pelo céu trocar;

E mais eleva o coração de um homem
Ser de homem sempre e, na maior pureza,
Ficar na terra e humanamente amar.

Olavo Bilac

sábado, setembro 18, 2010

Poesia

Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.

No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.

Ele está cá dentro
e não quer sair.

Mas a poesia desse momento
inunda minha vida inteira.


Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, setembro 17, 2010

Love

Foto: Annie Liebovitz

quarta-feira, setembro 15, 2010

Antônio Poteiro - 2

John and George


Quem entendeu bem os Beatles acabou sempre tendo uma certa preferência por esses dois. Não sei a razão disso e do fato dos dois terem ido primeiro. Deve ser pra sacanear mesmo...

Mas apareceu essa foto aí, dos idos de 1974 e é uma preciosidade. Deixo aqui o link do Plastic Ono Blog, que foi o primeiro blog em português que publicou a foto. Seria o meu o segundo?


segunda-feira, setembro 13, 2010

domingo, setembro 12, 2010

sábado, setembro 11, 2010

Inscrição

Sou entre flor e nuvem,
estrela e mar.
Por que havemos de ser unicamente humanos,
limitados em chorar?
Não encontro caminhos
fáceis de andar
Meu rosto vário desorienta as firmes pedras
que não sabem de água e de ar
E por isso levito.
É bom deixar
um pouco de ternura e encanto indiferente
de herança, em cada lugar.
Rastro de flor e estrela,
nuvem e mar.
Meu destino é mais longe e meu passo mais rápido:
a sombra é que vai devagar.

Cecília Meireles

Goodbye Blue Sky 091101

Celeste

Dias passam em sequência
Sem que o Sol se canse
Na sua clara essência
De buscar a sua chance

E a Lua no céu clareia
Seu próprio caminho no chão
Pr’aquilo que ela anseia

E se olham e se buscam
E se ligam e se tocam
Giram em elipses
Clamam por eclipses
Um quantum de luz
Mais que seduz
Explode em paixão
À palma da mão

E no amanhecer e no poente
Se vêem distantes
E a Lua sabe o que o Sol sente
Em todos os instantes

E o Sol no céu sozinho
Conduz seu próprio corpo
Pr’aquele que é seu caminho

Noite e dia, dia pós noite
Lua e Sol em comunhão
Separados por um açoite
Mas juntos, num só coração

sexta-feira, setembro 10, 2010

Espelho de Água

Escrevi esse poema quando eu tinha vinte anos. Algumas coisas são perenes, mesmo em meio a tantas efêmeras. E assim, mesmo agora, tantos anos depois, leio esses versos e acabo me vendo ali, na beira do rio.



Espelho de Água

Chego na beira do rio
E olho para aquele espelho de água.
Estou bem na minha frente
Me delatando
Me denunciando
Me cobrando.
Às vezes eu me olho turvamente,
Ondulantemente
Tranquilamente
Bem na mente.
Sinto-me olhando-me no fundo,
No meu fundo, do fundo do rio.
Não sei porque, mas rio,
E acho graça
Sentindo-me olhado por mim.
Aí então,
Com a minha mão,
Toco a água,
Quebro o espelho
E lavo meu rosto.



quinta-feira, setembro 09, 2010

Screen Technology

De vez em quando achamos que o futuro parece ser algo lá no horizonte. Mas às vezes, parece que ele está ali na esquina. Ou aqui na tela do computador.



terça-feira, setembro 07, 2010

Maria do Carmo

Maria do Carmo trouxe o amor em seu nome e também em seu olhar, em seu jeito de cuidar das pessoas, em sua generosidade.

Sua alma sempre mostrou a transparência de sua franqueza. E assim, por toda uma vida, a verdade foi sua palavra.

Com um coração que não lhe cabia, deixava à tona a emoção por bocas e olhos. Com a garra de quem veio antes, abraçava toda luta que lhe aparecesse.

Filha de fibra, irmã de luz. Mulher de paixão, mãe de amor, de exemplo e dedicação. Maria do Carmo trouxe o amor em seu nome. E o deixou entre nós.

Friendly words

O Júnior Degani é um contribuinte de sempre desse blog e essa é mais uma indicação dele. Esse vídeo veio junto com palavras amigas que sempre recebo dele, as quais agradeço aqui, em público.

Fistful of Mercy from Fistful of Mercy on Vimeo.



terça-feira, agosto 31, 2010

Timão

Pra começar bem Setembro. Pra começar mais cem anos de paixão.



Luar

O luar enche a terra de miragens
E as coisas têm hoje uma alma virgem,
O vento acordou entre as folhagens
Uma vida secreta e fugitiva,
Feita de sombra e luz, terror e calma,
Que é o perfeito acorde da minha alma.

Sophia de Mello Breyner Andresen

Porque as mulheres amam os homens

Porque as mulheres amam os homens, segundo Paulo Coelho:

Amamos os homens porque eles não conseguem fingir um orgasmo, mesmo que queiram.
Porque jamais vão nos entender, e mesmo assim continuam tentando.
Porque conseguem ainda ver nossa beleza, mesmo quando nós mesmos já somos incapazes de acreditar nisso.
Porque entendem equações, política, matemática, economia, e desconhecem o coração feminino.
Porque são amantes que só descansam quando nós temos (ou fingimos) prazer.
Porque conseguiram elevar o esporte a algo próximo a uma religião.
Porque jamais tem medo do escuro.
Porque insistem em consertar coisas que estão além de suas habilidades, e se dedicam a isso com o mesmo entusiasmo de um adolescente, e se desesperam quando não conseguem.
Porque jamais ficam comentando o que o vizinho pode pensar.
Porque sabemos sempre o que estão pensando, e quando abrem a boca dizem exatamente o que imaginávamos.
Porque jamais sonharam em se torturar com saltos altos.
Porque adoram explorar nosso corpo.
Porque uma garota de quatorze anos pode deixá-los em silêncio, e uma mulher de vinte e cinco consegue domá-los sem muito esforço.
Porque são sempre atraídos por extremos: opulentos ou ascéticos, guerreiros ou monges, artistas ou generais.
Porque fazem o possível e o impossível para tentar esconder suas fragilidades.
Porque o maior medo de um homem é não ser um homem – o que jamais passa pela cabeça de uma mulher (não ser uma mulher).
Porque sempre terminam a comida que está no prato, e não sentem culpa por causa disso.
Porque acham uma graça imensa em temas completamente desinteressantes, como o que aconteceu no trabalho, ou marcas de carros.
Porque são dotados de ombros onde conseguimos dormir sem muito esforço.
Porque estão em paz com seus corpos, exceto pequenas e insignificantes preocupações a respeito de calvície e obesidade.
Porque tem uma coragem impressionante diante de insetos.
Porque jamais mentem sobre a idade que têm.
Porque apesar de tudo que tentam demonstrar, não conseguem viver sem uma mulher.
Porque quando dizemos a um deles “eu te amo”, sempre pedem para que a gente explique exatamente como.

segunda-feira, agosto 30, 2010

Tin Pan Alley

Tem músicas que são sublimes, fora de qualquer padrão de comparação. No blues, isso fica sempre evidente. Não há como comparar uma interpretação com outra. Assim como não há como comparar momentos uns com outros.




sábado, agosto 28, 2010

O tempo é muito lento para os que esperam

O tempo é muito lento para os que esperam
Muito rápido para os que tem medo
Muito longo para os que lamentam
Muito curto para os que festejam
Mas, para os que amam, o tempo é eterno.

William Shakespeare

Recuso os sonhos que te ignoram


Recuso os sonhos que te ignoram e os desejos que não possas despertar.
Não quero fazer um gesto que não te louve, nem cuidar uma flor que não te enfeite;
não quero saudar as aves que ignorem o caminho da tua janela,
nem beber em ribeiros que não tenham acolhido o teu reflexo.
Não quero visitar países que os teus sonhos não tenham percorrido como taumaturgos vindos de fora,
nem habitar cabanas que não tenham abrigado o teu repouso.
Nada quero saber de quem te precedeu em meus dias,
nem dos seres que aí permanecem.


Rainer Maria Rilke

Perguntei a um sábio

Perguntei a um sábio,
a diferença que havia
entre amor e amizade,
ele me disse essa verdade…

O Amor é mais sensível,

a Amizade mais segura.
O Amor nos dá asas,
a Amizade o chão.

No Amor há mais carinho,

na Amizade compreensão.

O Amor é plantado

e com carinho cultivado,
a Amizade vem faceira,
e com troca de alegria e tristeza,
torna-se uma grande e querida companheira.

Mas quando o Amor é sincero

ele vem com um grande amigo,
e quando a Amizade é concreta,
ela é cheia de amor e carinho.

Quando se tem um amigo

ou uma grande paixão,
ambos sentimentos coexistem
dentro do seu coração.

William Shakespeare

quarta-feira, agosto 25, 2010

200 privilegiados

Em Julho, num evento beneficente para o Hoping Foundation, 200 sortudos tiveram o prazer de assistir essas duas feras tocando juntos novamente. Enjoy!

Hoping Foundation benefit performance from Hoping Foundation on Vimeo.



domingo, agosto 22, 2010

sexta-feira, agosto 20, 2010

Indivisíveis

O meu primeiro amor e eu sentávamos numa pedra.
Que havia num terreno baldio entre as nossas casas.
Falávamos de coisas bobas,
Isto é,que a gente achava bobas
Como qualquer troca de confidências entre crianças de cinco anos.
Crianças…

Parecia que entre um e outro nem havia ainda separação de sexos
A não ser o azul imenso dos olhos dela,
Olhos que eu não encontrava em ninguém mais,
Nem no cachorro e no gato da casa,
Que tinham apenas a mesma fidelidade sem compromisso
E a mesma animal – ou celestial – inocência,
Porque o azul dos olhos dela tornava mais azul o céu:
Não, não importava as coisas bobas que diséssemos.
Éramos um desejo de estar perto, tão perto
Que não havia ali apenas duas encantadas criaturas
Mas um único amor sentado sobre uma tosca pedra,
Enquanto a gente grande passava, caçoava, ria-se, não sabia
Que eles levariam procurando uma coisa assim por toda a sua vida…

Mário Quintana

Volpi - 5

quarta-feira, agosto 18, 2010

Hoje desaprendo o que tinha aprendido até ontem

Hoje desaprendo o que tinha aprendido até ontem
e que amanhã recomeçarei a aprender.
Todos os dias desfaleço e desfaço-me em cinza efêmera:
todos os dias reconstruo minhas edificações, em sonho eternas.

Esta frágil escola que somos, levanto-a com paciência
dos alicerces às torres, sabendo que é trabalho sem termo.
E do alto avisto os que folgam e assaltam, donos de riso e pedras.
Cada um de nós tem sua verdade, pela qual deve morrer.

De um lugar que não se alcança, e que é, no entanto, claro,
minhas verdades, sem troca, sem equivalência nem desengano
permanece constante, obrigatório, livre:
enquanto aprendo, desaprendo e torno a reaprender.

Cecília Meireles

Canção do dia de sempre

Tão bom viver dia a dia…
A vida assim, jamais cansa…
Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu…
E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência… esperança…
E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.
Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.
Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!
E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas…

Mario Quintana

sábado, agosto 14, 2010

Enrubescida

Daqui, do que vejo do céu
Dali, uma nesga de Lua
Assim vermelha
Quase sangue
Exangue
Virada pra cima
Pernas abertas
Lua rubra
Enrubescida de vontade

Daqui, do que vejo do quarto
Dali, no branco lençol
Assim espelha
Quase lida
Umedecida
Vidrada na sina
Páginas abertas
Rosa rubra
Enrubescida de verdade

O amor é uma companhia

O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.

Fernando Pessoa

quinta-feira, agosto 12, 2010

Eu gosto do seu corpo

Eu gosto do seu corpo
Eu gosto do que ele faz
Eu gosto de como ele faz
Eu gosto de sentir as formas do seu corpo
Dos seus ossos
E de sentir o tremor firme e doce
De quando lhe beijo
E volto a beijar
E volto a beijar
E volto a beijar

e.e. Cummings

LW with JH



quarta-feira, agosto 11, 2010

A letra e a música

Quando nos encontramos
Dizemo-nos sempre as mesmas palavras que todos os amantes dizem…
Mas que nos importa que as nossas palavras sejam as mesmas de sempre?
A música é outra!

Mário Quintana


terça-feira, agosto 10, 2010

Comigo, Contigo

Como contigo
Eu chego a mim!

Como me trazes
A esfera imensa
Do mundo meu
E toda a encerras
Dentro de mim!

Como contigo
Eu chego a mim!
Ah como pões
Dentro de mim
A flor, a estrela,
O vento, o sol,
A água, o sonho!…

Como contigo
Eu chego a mim!

Manuel Bandeira

sábado, agosto 07, 2010

Alta, assim

Nem me dei ao trabalho de ver se já havia publicado este poema antes aqui. Eu poderia sair buscando os posts antigos, mas... pra que?... Se publiquei, publico de novo. É que achei que ficou bom. E eu achar que ficou bom é raro.

Alta, assim

No fim de tarde
Depois da chuva
Um céu de âmbar
Salta assim
Aos olhos
À alma

No fim de tarde
Depois de tudo
Um sol bem tímido
Falta assim
Aos olhos
Acalma

No fim, bem tarde
Depois de tudo
Um véu diz tudo
Alta, assim
É a alma

quinta-feira, agosto 05, 2010

The Rain Song

Há muitos invernos, como este que em semanas também se esvairá, escutei essa música e nem acreditei que era do Led Zeppelin. A voz inconfundível do Robert Plant me fez ter a certeza que era mesmo.

Por muitos invernos ela tem em acompanhado e sempre estará por perto. Meus amigos de rock’n’roll sabem do que falo. Os que não sabem o que é isso, tem que experimentar.

Aí seguem duas versões lindas pra tocar a alma.






Ardo

De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo

Vinícius de Moraes

One



Is it getting better
Or do you feel the same?
Will it make it easier on you now
You got someone to blame?

You say
One love,one life
When it's one need
In the night
One love
We get to share
It leaves you, baby
If you don't care for it

Did I disappoint you
Or leave a bad taste in your mouth?
You act like you never had love
And you want me to go without

Well, it's too late
Tonight
To drag your past out
Into the light

We're one
But we're not the same
We get to carry each other
Carry each other
One

Have you come here for forgiveness?
Have you come to raise the dead?
Have you come here to play Jesus
To the lepers in your head?

Did I ask too much?
More than a lot?
You gave me nothing now
It's all I got

We're one
But we're not the same
Well
We hurt each other
Then we do it again

You say
Love is a temple
Love is a higher law
Love is a temple
Love is a higher law
You ask me to enter
But then you make me crawl
And I can't be holding on
To what you got
When all you got is hurt

One love
One blood
One life you got
To do what you should
One life
With each other
Sisters, and my brothers

One life
But we're not the same
We get to carry each other
Carry each other

One ... one
Uh, uh, uh, oh
Make, make it, make it
Ahh, ahh, oh
Ahh, ahh
And one
Ahh, ahh ... oh

Está melhorando?
Ou você ainda sente a mesma coisa?
As coisas vão ficar mais fáceis para você
agora que você tem alguém para culpar?

Você diz
Um amor, uma vida
Quando é alguém que à noite precisa
De um amor
Temos que compartilha-lo
Ele te abandona, baby
Se você não cuida dele

Eu te decepcionei?
Ou deixei um gosto ruim em sua boca?
Você age como quem nunca teve um amor
E quer que eu continue sem nenhum

Bem, é muito tarde
Esta noite
Para trazer o passado à tona
Somos um

Mas não somos os mesmos
Temos que carregar um ao outro
Carregar um ao outro
Como um só...



Você veio aqui pelo perdão?
Você veio levantar os mortos?
Você veio aqui brincar de Jesus
para os leprosos que você inventa?

Eu te pedi muito?
Mais do que devia?
Você não me deu nada
Agora é tudo que eu tenho

Somos um
Mas não somos os mesmos
Ferimos um ao outro
E estamos fazendo de novo


Você diz
O amor é um templo
O amor é a lei suprema
O amor é um templo
O amor é a lei suprema
Você me pede para entrar
E então você me faz rastejar
E eu não posso continuar me agarrando
Ao que você tem
Quando tudo que você tem são feridas

Um amor
Um sangue
Uma vida
Você tem que fazer o que deve
Uma vida
Entre si
Irmãs e Irmãos

Uma vida
Mas não somos os mesmos
Temos que carregar um ao outro
Carregar um ao outro

Como um só

quarta-feira, julho 28, 2010

Eu vou cuidar do seu jardim




Os Cegos Do Castelo


Nando Reis

Eu não quero mais mentir
Usar espinhos que só causam dor
Eu não enxergo mais o inferno que me atraiu
Dos cegos do castelo me despeço e vou
A pé até encontrar
Um caminho, o lugar
Pro que eu sou

Eu não quero mais dormir
De olhos abertos me esquenta o sol
Eu não espero que um revólver venha explodir
Na minha testa se anunciou
A pé a fé devagar
Foge o destino do azar
Que restou

E se você puder me olhar
E se você quiser me achar
E se você trouxer o seu lar

Eu vou cuidar, eu cuidarei dele
Eu vou cuidar
Do seu jardim
Eu vou cuidar, eu cuidarei muito bem dele
Eu vou cuidar
Eu cuidarei do seu jantar
Do céu e do mar, e de você e de mim


domingo, julho 25, 2010

God bless Yes

Yes era uma incógnita pra mim nos idos dos anos 70. Eu sabia que era um grupo diferente, mas pouco conhecia dele. Muito tempo depois foi o Tostão, também conhecido como Júlio César Lourenço, quem me apresentou aos sons maravilhosos que tão bem serviram de trilha para nossas intrépidas noites e tardes universitárias. God bless Yes.


quinta-feira, julho 22, 2010

All Things Must Pass



Sunrise doesn't last all morning.
A cloudburst doesn't last all day.
Seems my love is up
And has left you with no warning.
It's not always been this gray.

All things must pass.
All things must pass away.

Sunset doesn't last all evening.
A mind can blow those clouds away.
After all this
My love is up and must be leaving.
It's not always been this gray.

All things must pass.
All things must pass away.

All things must pass.
None of life's dreams can last.
So, I must be on my way
To face another day

And darkness only stays at nighttime.
In the morning it will fade away.
Daylight is good
At arriving at the right time.
It's not always gonna be this gray.

George Harrison

O nascer do sol não dura a manhã toda
Um céu carregado de nuvens não dura o dia todo
Parece que meu amor está acabado e a deixou sem nenhum aviso
Não será sempre cinza assim

Tudo deve passar
Tudo deve ir embora

O por do sol não dura a tarde toda
Uma mente pode soprar essas nuvens pra longe
Depois disso, meu amor está acabado e deve ir embora
Não será sempre cinza assim

Tudo deve passar
Tudo deve ir embora
Tudo deve passar
Nada na vida pode durar pra sempre
Então, devo seguir meu caminho
E encarar um novo dia

A escuridão só fica durante a noite
De manhã vai desaparecer
A luz do dia é boa em chegar no momento certo
Não será sempre cinza assim

Tudo deve passar
Tudo deve ir embora
Tudo deve passar
Tudo deve ir embora

sábado, julho 17, 2010

Mineiro em Nova York

Contam que num dia desses aí o mineirinho foi pra Nova York. E lá saiu à noite, se encontrou com um punhado de gente... Numa dessas, uma garota noviorquina se encantou por ele e o arrastou pro seu loft. Mineiro é “come-quieto”... Então ele foi sem falar muitas palavras.

Na hora da coisa toda, ela tava toda entusiasmada com a performance do quieto mineirinho e começou:
— Once more! Once more!
E o mineirinho respondeu:
— Berlândia! Berlândia!

Sonho

Quantas vezes, em sonho, as asas da saudade
Solto para onde estás, e fico de ti perto!
Como, depois do sonho, é triste a realidade!
Como tudo, sem ti, fica depois deserto!

Sonho… Minha alma voa. O ar gorjeia e soluça.
Noite… A amplidão se estende, iluminada e calma:
De cada estrela de ouro um anjo se debruça,
E abre o olhar espantado, ao ver passar minha alma.

Há por tudo a alegria e o rumor de um noivado.
Em torno a cada ninho anda bailando uma asa.
E, como sobre um leito um alvo cortinado,
Alva, a luz do luar cai sobre a tua casa.

Porém, subitamente, um relâmpago corta
Todo o espaço… O rumor de um salmo se levanta
E, sorrindo, serena, apareces à porta,
Como numa moldura a imagem de uma Santa…

Olavo Bilac

sexta-feira, julho 16, 2010

As sem-razões do amor

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabê-lo.
Eu te amo porque te amo.

Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no elipse.

Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.

Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.

Carlos Drummond de Andrade



quinta-feira, julho 15, 2010

Dino

Isso é muito divertido! Ser menino é bom demais!



quinta-feira, julho 08, 2010

Soneto do Amor Total

Amo-te tanto meu amor… não cante
O humano coração com mais verdade…
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te enfim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.

Vinícius de Moraes

quarta-feira, julho 07, 2010

Setenta


Meu primo Júnior é quem sempre me lembra. E hoje, sete do sete, Ringo Starr faz setenta anos. O primeiro beatle a chegar por ali.

Setenta vezes sete vezes de alegrias pra ele e pra todos os que curtem Beatles.



Vinte anos sem Cazuza

Grande parte de minhas emoções foram fermentadas com as letras e as músicas do Cazuza. Éramos mais ou menos da mesma idade. Ele sim era um poeta. Eu não. Aquelas emoções que ganharam tons de melancolia ou de alegria, de verdade ou de saudade, de tesão ou de desilusão permaneceram em todos nós, que convivemos com a época do Cazuza. Foi uma época muito boa.



sábado, julho 03, 2010

Entre os teus lábios

Entre os teus lábios
é que a loucura acode,
desce à garganta,
invade a água.

No teu peito
é que o pólen do fogo
se junta à nascente,
alastra na sombra.

Nos teus flancos
é que a fonte começa
a ser rio de abelhas,
rumor de tigre.

Da cintura aos joelhos
é que a areia queima,
o sol é secreto,
cego o silêncio.

Deita-te comigo.
Ilumina meus vidros.
Entre lábios e lábios
toda a música é minha.

Eugénio de Andrade

segunda-feira, junho 28, 2010

Highlanders da Copa

Num filme dos anos 80 chamado “Highlander, O Guerreiro Imortal”, Christopher Lambert fazia um guerreiro escocês do século XVI, que era imortal. Ele ia encontrando outros highlanders, lutava com eles e a cada cabeça cortada a força do oponente morto era captada pelo vencedor, que o tornava mais forte e preparado para novos encontros fatais.

Estive pensando nisso nessas chaves da Copa. Alemanha eliminou Inglaterra. Passou sua teutônica espada no nobre pescoço britânico. Será que ela captou para si as forças clássicas da esquadra da ilha do Mar do Norte? Agora é a Argentina. Se ganhar da Argentina, ficará com as forças dos hermanos? E se for o contrário? A Argentina levará adiante todas essas forças?

Se fosse assim, o Brasil estaria perdido... Vai pegando alguns fraquinhos e topando com feras cheias de forças pela frente. Tomara que este post seja apenas pra lembrar da música do Queen...




quarta-feira, junho 23, 2010

Noite de São João

Noite de São João para além do muro do meu quintal.
Do lado de cá, eu sem noite de São João.
Porque há São João onde o festejam.
Para mim há uma sombra de luz de fogueiras na noite,
Um ruído de gargalhadas, os baques dos saltos.
E um grito casual de quem não sabe que eu existo.

Fernando Pessoa

terça-feira, junho 22, 2010

Alguém amou

Alguém amou e, amando, encontrou-se.
Quantos não há, porém, que amam para se perderem.
Que seria da razão e do bom senso,
se não houvesse a loucura?
Que seria do prazer dos sentidos,
se por trás dele não estivesse a morte?
Que seria do amor
sem o eterno e mortal antagonismo dos sexos?

Herman Hesse

sábado, junho 19, 2010

Ouvir estrelas

Mais uma do Bilac, atendendo a uma sugestão...

Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas.

Olavo Bilac

Enquanto isso, na British Petroleum

quinta-feira, junho 17, 2010

Volpi - 4

Estrambote Melancólico

Tenho saudade de mim mesmo,
saudade sob aparência de remorso,
de tanto que não fui, a sós, a esmo,
e de minha alta ausência em meu redor.

Tenho horror, tenho pena de mim mesmo
e tenho muitos outros sentimentos
violentos. Mas se esquivam no inventário,
e meu amor é triste como é vário,
e sendo vário é um só.

Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, junho 11, 2010

Discurso

E aqui estou, cantando.

Um poeta é sempre irmão do vento e da água:
deixa seu ritmo por onde passa.

Venho de longe e vou para longe:
mas procurei pelo chão os sinais do meu caminho
e não vi nada, porque as ervas cresceram e as serpentes
andaram.

Também procurei no céu a indicação de uma trajetória,
mas houve sempre muitas nuvens.
E suicidaram-se os operários de Babel.

Pois aqui estou, cantando.

Se eu nem sei onde estou,
como posso esperar que algum ouvido me escute?

Ah! Se eu nem sei quem sou,
como posso esperar que venha alguém gostar de mim?

Cecília Meireles

sábado, junho 05, 2010

Meu ambiente

Em Janeiro de 2009 postei aqui um vídeo com uma música maravilhosa do Pink Floyd. Hoje é Dia Mundial do Meio Ambiente e muito dele, desse meio em que vivemos, vem sendo destruído por nós mesmos, moradores e passageiros.

Ao ver esse vídeo senti o quanto somos frágeis e logo iremos nos tornar pó. Do pó viemos, ao pó voltaremos. Aqui, um pedacinho do texto que escrevi naquele Janeiro:

"Essa é a minha casa. Essa é a sua casa. Vai chegar um dia que me tornarei pó e ao pó voltarei. Me juntarei ao seu pó. Serei a mesma terra que entrou pelos dedos dos meus pés. Serei a mesma areia que se sujou com o sangue do meu nariz. Serei a mesma argila das margens dos rios que conheci com meu pai. Serei pedra, como tão pouco fui. Esta é a minha casa e olhando as imagens, ouvindo a música, já fiquei com saudades dela."



Cada qual tem o seu álcool

Cada qual tem o seu álcool.
Tenho álcool bastante em existir.
Bêbado de me sentir, vagueio e ando certo.
Se são horas, recolho ao escritório como qualquer outro.
Se não são horas, vou até ao rio fitar ao rio, como qualquer outro.
Sou igual.
E por detrás de isso, céu meu, constelo-me às escondidas e tenho o meu infinito.

Fernando Pessoa

quinta-feira, junho 03, 2010